Saturday, July 30, 2011

A doença

Mesmo estando na Europa no momento do atentado da Noruega, foi no Brasil, que tive tempo para buscar mais informações e ler alguns ótimos artigos. Uns exploram a loucura isolada do norueguês, outros se esforçam para integrá-lo ao contexto europeu. Certamente, há uma combinação dos dois aspectos numa questão tão complexa.

Gostaria de ressaltar que o terrorismo de extrema direita vai muito além do espetáculo momentâneo de horror passado na Noruega. São eventos diários: Um espancamento na Alemanha, uma pichação na França, um cemitério vandalizado na Áustria, um discurso furioso na Holanda e, até mesmo, assassinatos isolados. Os alvos são sempre os mesmos.

A Europa já está tão acostumada, que tais notícias raramente recebem destaque internacional. Mais do que isso, o eleitorado se acomodou e deixou com que o discurso inflamado da extrema direita voltasse à tona depois de anos no ostracismo.

Parece incrível, mas o atentado da Noruega foi importante para alguma coisa. Ele chacoalhou os cidadãos acomodados e os políticos. Ele nos faz lembrar os riscos da radicalização e do fanatismo. Faz lembrar a tragédia não tão remota da Segunda Guerra, em que todos perderam.

Na última semana, governos e serviços de inteligência começaram a prestar mais atenção nos terroristas cristãos e não somente nos islâmicos. E, mais importante, milhares de europeus, à beira da sedução pelo discurso conveniente da extrema direita, foram devidamente relembrados do seu verdadeiro ideário.

Infelizmente, a semente do ódio é mais comum do que parece. Os políticos europeus, diante da crise atual, apresentam-se como vítimas da especulação internacional. Na Alemanha, gregos e espanhóis são vilões, esquecendo-se de que o país foi o grande beneficiário da moeda única. Enfim, continua-se buscando a culpa alheia, o bode expiatório.

Não adianta fazer uma moeda única, liberar as fronteiras e promover qualquer tipo de união, enquanto perdurar este comportamento tão primitivo. Mesmo sem saber, políticos de todas as linhas ideológicas acabam alimentando a doença de Anders Behring Breivik, a doença da Europa, a doença da humanidade. Ainda precisamos de décadas de democracia, espírito republicano e verdadeiros estadistas para nos curarmos.

Foto: Outra tomada do centro velho de Arbois, com as casas que avançam sobre o  La Cuisance.

Thursday, July 28, 2011

Campeão imoral

Na última terça-feira, César Cielo levou a medalha de ouro na prova dos 50m borboleta do mundial da China. A premiação foi marcada por copiosas vaias da plateia e pelo protesto velado dos seus oponentes. Hoje, a sua derrota nos 100m gerou tanto solidariedade como desprezo dos próprios brasileiros. Afinal, César ganhou ou perdeu? O Brasil ganhou ou perdeu?

A aplicação de uma punição muito branda para um atleta envolvido com doping é uma opção pelo curto prazo. Punir uma das nossas maiores chances de medalhas às vésperas das Olimpíadas 2012, e no espírito de preparação de 2016, seria um golpe duro. O jeitinho brasileiro funcionou para se encontrar uma solução conciliadora, com o aval das autoridades mundiais da natação. Todos erraram.

Cielo já está na história esportiva do Brasil pelas suas respeitáveis conquistas. Para brilhar nas próximas competições, o Brasil precisa formar muitos novos atletas, que respeitem a ética esportiva. Uma punição mais rigorosa ao nadador seria um excelente exemplo para as futuras gerações, mostrando que a vitória é fruto da dedicação e da técnica. Jamais, dos truques baratos e da malandragem.

Cielo poderá ser hostilizado por muito tempo. E nós perdemos uma ótima oportunidade de dar exemplo. Perpetuamos a Lei de Gérson.

Evidentemente, este post não é apenas sobre natação, um dos menores problemas do Brasil. Estou torcendo para que a fúria moralizadora de Dilma no Ministério dos Transportes amplie-se para toda Esplanada. E que não seja só contra os "aliados", mas com os seus correligionários também.


Foto: O centro velho de Arbois, cortado pelo rio La Cuisance. Como nas pequenas cidades francesas, entenda-se por velho construções de 200 a 500 anos.

Saturday, July 9, 2011

Hit parade

Usei o serviço "Blog2Print" para imprimir os meus posts de 2009. O resultado foi um livro muito bem acabado. Quase tudo automático e bem diagramado. Os comentários aparecem na sequência dos posts e as fotos são encaixadas no texto. Em formato pequeno, elas ficaram ótimas. Serviram de prova para uma futura impressão em tamanho maior.

As únicas surpresas foram os erros de digitação. Relendo uma dúzia de posts antigos, peguei alguns erros que escaparam da minha revisão. O que foi mais importante para realçá-los? O tempo ou a impressão em papel? Não sei, mas acreditem em mim. Se escrevi "os livro é bom", foi erro de digitação e não uma tentativa de inclusão social neste blog.

Entre os posts de 2009, está o meu post mais lido de todos os tempos. Nas estatísticas do Blogger, percebi que ele é acessado continuamente desde então. Entre tantas coisas interessantes que escrevi, por que um post tão vagabundo sobre a música francesa faz o maior sucesso?

Parei para investigar. Elementar, meu caro leitor. Quando se escreve na barra do Google "cantores franceses contemporâneos", o motor de busca aponta o meu post em primeiro lugar. Daí, a enxurrada de acessos, passados mais de dois anos da sua postagem.

Vejam o segundo parágrafo do post: "Há alguns dias, sugeri alguns cantores franceses contemporâneos". Dá para imaginar como o Google chegou à sua conclusão.


Foto: Inicio a série de fotos de Arbois, outra cidade da região da Franche-Comté, departamento do Jura. Os cartazes espalhados pela cidade celebravam o festival do vinho do Jura.

Sunday, July 3, 2011

Pão francês

Estive viajando. Ocupado, mas não desconectado. No retorno, li algumas matérias sobre a possível fusão do grupo Pão de Açúcar com o Carrefour, estimulada pelo BNDES. O senador Aloysio Nunes, do PSDB, ironizou: "Duas redes de varejo se casam e quem dá o presente é o Brasil, ou melhor, o contribuinte?...Daqui a pouco o BNDES vai contribuir para a fusão de salões de beleza". Se eu tenho minhas restrições à iniciativa apoiada pelo governo, a manifestação da oposição também não é totalmente correta.

1) Ele questiona a concentração do setor no Brasil. Concordo. A concentração já é muito grande. Na França, sede do Carrefour e do Casino, há outros grupos fortes brigando ferrenhamente com ambos: Auchan, E.Leclerc, Intermarché e Système U. O mercado ainda não é totalmente livre, mas funciona melhor do que aqui. Um país do tamanho do Brasil pode ter e merece um varejo mais competitivo.

2) Quando questiona a participação no BNDES no processo. Concordo. O banco já virou motivo de chacota. Tem sido uma máquina de privilégios, uma ferramenta a serviço dos governantes e não do Brasil.

3) Quando coloca o destaque no contribuinte. Concordo. Todos que estão lá, em Brasília, têm a obrigação de zelar pelo dinheiro público, pelo nosso dinheiro. Todos os políticos devem ter como prioridade os quase 200 milhões de cidadãos contribuintes.

4) Quando insinua que o Brasil dá um presente a grupos estrangeiros, embora não esteja explícito. Discordo. O BNDES deve escolher os projetos que são bons para o Brasil. O que é melhor para o país, uma empresa americana que pega dinheiro do BNDES para investir no Brasil ou uma empresa brasileira que pega dinheiro para investir nos EUA? Não existe uma resposta, depende da situação. Embora o banco possa privilegiar as empresas nacionais, o mundo de hoje não é dividido simplesmente entre grupos nacionais e estrangeiros. O capital é um conceito meio "fluido", mas isso é uma outra história.

5) Quando ironiza os salões de beleza. Discordo. Por que não? Organizar e solidificar o setor de serviços é uma ótima idéia. São grandes geradores de empregos. O Brasil precisa de inúmeros hotéis, restaurantes e salões de beleza. Possivelmente, tais estabelecimentos tragam um retorno maior do que uma montadora de kits de automóveis importados da Coréia.

Enfim, muitos dos "escândalos" anteriores do BNDES ficaram distantes do público em geral. Um episódio mexendo com o varejo tem o mérito de expor a questão para milhões, antes indiferentes ao tema.


Foto: Núcleo da abadia de Baume-les-Messiers, na região da Franche-Comté. A pequena cidade gira em torno dela.