Na última semana, os principais executivos de quatro das Big
Tech (Apple, Amazon, Google e Facebook) foram convocados para depor no
Congresso norte-americano por suspeitas de práticas anticoncorrenciais.
As audiências estão longe de serem vistas como algo burocrático.
Além das práticas comerciais supostamente abusivas, o contexto é delicado. Somam-se
à pandemia, as manifestações, o ano eleitoral e até mesmo as ainda não digeridas
eleições de 2016.
A pandemia foi um acelerador de negócios para os gigantes do
mundo digital. O valor das quatro empresas acima com a Microsoft alcança 5
trilhões de dólares, representando quase 20% do índice S&P da bolsa
norte-americana. Nunca houve tamanha concentração de valor.
Por outro lado, a discussão sobre fake news, manipulação e
influência nas redes está mais quente do que nunca. Faz-se necessária uma resposta
da sociedade para que possamos garantir o pleno funcionamento das democracias.
Nos Estados Unidos, durante as primárias democratas, a campanha do “break them up”
(quebrem as Big Tech) obteve adesões importantes - Elizabeth Warren e Bernie Sanders.
Os conservadores, por sua vez, ressentem-se de um viés
progressista das redes sociais, que supostamente seriam mais rigorosas com as
fake news criadas por eles. Os conflitos pessoais de Donald Trump com cada uma
das empresas acima são um capítulo a parte.
O cerne da discussão está nas seguintes práticas: 1) A Amazon é acusada
de abusar de seu papel de varejista e de plataforma que hospeda vendedores de
terceiros; 2) A Apple é acusada de usar injustamente sua influência sobre a App
Store para bloquear rivais e forçar os aplicativos a pagar altas comissões; 3)
O Facebook é acusado de buscar o monopólio das redes sociais; 4) A Alphabet,
empresa mãe do Google, é
questionada por causa do domínio do Google em publicidade on-line, pesquisa e
software para smartphone.
Os congressistas norte-americanos trouxeram muitas
evidências das práticas acima. Acredito que o meu caro leitor, assim como eu,
não esteja surpreso com as mesmas. Portanto, imagino que as audiências continuem por algum tempo.
O mundo da tecnologia já proporcionou processos antitruste,
por exemplo, com a IBM e a Microsoft no banco dos réus. Entretanto, o
calendário político parece incompatível com o econômico e tecnológico. Os
processos são tão lentos, que acabam perdendo sentido. A tecnologia evolui,
surgem alternativas de mercado e as empresas adotam comportamentos corretos. Se
os processos da IBM e Microsoft não chegaram ao final esperado, parece-me que a
longa temporada sob pressão pública valeu à pena. O caminho foi mais importante
do que o destino.
Muitos políticos de diversos matizes ideológicos, num
espírito revanchista e punitivo, estão afoitos para quebrar essas empresas, o
que levaria alguns anos e teria eficácia duvidosa. O mundo não precisa de que
as Big Tech passem de 5 para 20. O mundo precisa de regulação, precisa de leis
para 2021.
Fecho o post com um texto de Zachary Karabell para a revista
Wired: “O que precisamos agora é de um novo marco regulatório baseado nas
questões atuais: privacidade, quem possui e lucra com dados, concorrência e
inovação. Esses devem ser os pontos de partida para o desenvolvimento da
política, no lugar do foco no tamanho ou número de empresas de tecnologia.
Precisamos perguntar quais regras protegeriam os consumidores, garantiriam a
inovação contínua e permitiriam a concorrência, sem criar problemas adicionais
e não intencionais. A resposta não se parece com as que foram desenvolvidas há
mais de 100 anos; e adaptar os desafios atuais para aquele molde do século passado
só pode piorar as coisas. Quebrar as Big Tech tem a virtude de soar simples, e
todos os vícios de serem simplistas. Temos problemas reais que precisam de
pensamento criativo; os regulamentos do passado, que não funcionaram tão bem
mesmo assim, não são uma resposta”.
Foto: E por falar em Congresso, eis o Parlamento Húngaro,
cartão postal de Budapeste. Foto tirada no verão europeu de 2016.
"A tecnologia evolui, surgem alternativas de mercado... Se os processos da IBM e Microsoft não chegaram ao final esperado, parece-me que a longa temporada sob pressão pública valeu à pena. O caminho foi mais importante do que o destino."
ReplyDeletePerfeito.