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Thursday, May 22, 2025

Espiões entre nós


 

Este post é inspirado em dois casos recentes que ilustram como funciona o mundo da espionagem. A analogia do iceberg não vale para esse universo, pois a pontinha visível é ainda muito menor. De vez em quando, a gente vê uma lasquinha e fica imaginando o tamanho e a sofisticação das redes de espionagem a serviço de países - seja para inteligência ou, mais comum nos dias de hoje, para criminalidade de Estado.

Quem não está acostumado com filmes e livros de espionagem até estranha, mas essas descobertas não surpreendem. Afinal, a arte imita a vida. Ou é o contrário?

A primeira descoberta foi a utilização do Brasil como base na formação de agentes russos. Os espiões fazem um estágio por aqui, onde constroem uma nova vida, que será amplamente rastreada com relacionamentos e documentos. Tudo isso é essencial para que, numa nova fase, o espião possa atuar em outro país com uma ficha “limpa” e cheia de vínculos comprováveis com o Brasil. Essa prática envolve anos de preparação e milhões em investimento para criar uma biografia perfeita - emprego, família, redes sociais, tudo cuidadosamente forjado.

Enquanto a Rússia segue a receita da KGB, investindo no longo prazo, a Coreia do Norte é mais direta. Como foi recentemente descoberto, desenvolveram uma máquina de infiltração de profissionais de TI em empresas ocidentais. Apesar dos currículos terrivelmente falsos, a onda de trabalho remoto pós-pandemia e o eterno déficit de profissionais de TI fizeram com que as empresas ocidentais baixassem a guarda e contratassem inúmeros espiões.

A TI tem acesso privilegiado a muitos dados e, quando não os tem, sabe o caminho para encontrá-los. O caminho para os norte-coreanos acessarem dados sensíveis não é muito longo. Daí em diante, é a mesma estratégia dos cibercriminosos: comercializar os dados, extorquir o proprietário das informações — ou ambos.

Quando se fala em espionagem, muitos ainda imaginam agentes com disfarces elaborados, gadgets mirabolantes e missões de tirar o fôlego. Mas a realidade, como sempre, mostra que o mundo das sombras é muito pragmático e, em certos aspectos, até mais inquietante do que qualquer roteiro cinematográfico.

Rússia e Coreia do Norte exploram vulnerabilidades gritantes. No Brasil, a facilidade de acesso a documentos legítimos é a brecha perfeita para quem precisa desaparecer de um país e surgir oficialmente em outro. No setor de tecnologia, a combinação de escassez de talentos e processos de recrutamento pouco rigorosos abre as portas para qualquer um que apresente um perfil convincente — mesmo que fabricado.

Enfim, são lembretes de que os espiões não estão apenas na tela de cinema ou atrás de celebridades e estadistas, mas podem ser seu colega de trabalho, seu vizinho, etc. Como escrevi recentemente no caso do INSS, onde houver uma fragilidade, haverá alguém para explorá-la. Portanto, é dever de todo cidadão e profissional encontrar e denunciar as pontas soltas do sistema.



Foto: Navegando pelas águas do Elba de Praga a Berlim (abril de 2024).

Monday, May 5, 2025

Assaltando os vovôs



Tem muita gente lacrando com a fraude no INSS? Tem muita gente tirando proveito político do fato? Claro. Tudo isso faz parte do sistema.

O que importa é que essa fraude bilionária chama atenção por vários aspectos fundamentais:

  1. A roubalheira não é exclusiva dos grandes contratos ou dos negócios travados pelos titãs estatais, como a Petrobrás. Roubar “só um pouquinho” de milhões de brasileiros dá o mesmo resultado. E deve haver muitas outras oportunidades por aí.

  2. A crueldade dos corruptos não tem limites. Desviar de aposentados que recebem muito pouco é um absurdo. As redes de corrupção não estão nem aí para suas vítimas.

  3. Quando o governo promete o reembolso imediato das vítimas, o escárnio se completa. Será que alguém ainda não entendeu que o dinheiro do governo é o nosso dinheiro?

Há, no entanto, uma ponta de positividade: apesar de todos os interesses contrários, a investigação avançou e expôs figuras bem próximas ao Planalto. Mais do que isso — ganhou destaque até da mídia geralmente alinhada ao governo. Parabéns aos envolvidos. Agora é essencial que a investigação seja exemplar: que revele todos os mecanismos utilizados, que liste todos os envolvidos — dentro e fora do INSS — e que se torne um caso de referência no combate à corrupção.

O INSS é uma organização tradicional, com a maioria dos seus servidores formada por profissionais honestos e dedicados. Conta ainda com o suporte técnico da renomada Dataprev. O Estado deve mover todos os esforços para reaver o dinheiro roubado, inclusive sequestrando todos os bens disponíveis dos envolvidos. Aí, sim, discutimos o que fazer com a diferença.

Mais importante ainda é que esse escândalo gere aprendizado institucional. Que não se trate apenas de punir os culpados, mas de fortalecer os controles, blindar processos digitais, e garantir auditorias contínuas. A confiança pública é frágil — e precisa ser restaurada com ação firme, transparente e duradoura.


Foto: Castelo de Moritzburg, Alemanha (2024). Passagem de uma viagem que fiz ao longo do Elba, dos arredores de Praga às proximidades de Berlim.