Friday, December 26, 2014

Detetives

Agredeço a todos que escreveram sobre o meu último post. Não imaginava despertar tamanha solidariedade, era para ser um post apenas engraçadinho. Não fosse o furto, seria mais um daqueles posts sobre as greves europeias.

Ainda sobre o triste incidente, pensei várias vezes no desafio daqueles dois que invadiram meu apartamento para fazer a “limpeza”. O que roubar?

A pergunta parece simples, mas só ladrões experientes fazem as escolhas certas. Afinal, eles precisam carregar as coisas roubadas mantendo uma certa agilidade durante a fuga. Há uma combinação de fatores como valor de mercado, volume e peso.

Enquanto o policial belga caçava digitais no meu apartamento, eu pensava - caríssimos leitores, não pensem em Hercule Poirot. Jacques Clouseau é bem mais realista - Eu só queria entender o que tinha acontecido. 

Percebi que os bandidos revistaram todo apartamento, selecionaram o que interessava e, antes da saída, fizeram a triagem. Levaram tudo para a mesa de jantar e lá escolheram o que seria furtado.

- Entre um Blackberry e um aparelho de barbear da Gilette, optaram pelo último.
- Entre um vidrinho de perfume da Armani e um GPS, escolheram o frasquinho.
- Entre um leitor de livros Kindle e um porta moedas com alguns poucos euros, ficaram com o dinheirinho vivo. Será que eles não gostam dos meus livros? Snif snif...  

Enfim, os gatunos sabem das coisas ;-)

Como provavelmente não terei tempo para escrever um novo post nos próximos dias, deixo os meus votos de Boas Festas e Ótimo Ano Novo. E se der alguma coisa errada em 2015, que seja matéria prima para novos posts. Afinal, a gente perde um monte de coisas, mas não perde a piada.


Foto: Como “post cartão de Natal”, aí vai este GIF animado montado sobre fotos recentes da fonte de Evian Les Bains, ao pé dos Alpes e às margens do Lago Leman.

Saturday, December 20, 2014

Perdas e danos

Nas últimas semanas, percebi que greve é coisa profissional aqui na Bélgica. Não é algo para atrapalhar nossas vidas só um pouquinho, é parada geral mesmo!

Sabendo da greve geral prevista para o último dia 15, remanejei meus compromissos para Paris. Até aí, foi fácil.  O problema é que, antes da greve em si, há “ensaios”. O movimento começou em novembro, com episódios de greves parciais semanais.

Num desses dias de greve parcial, por exemplo, fui ao aeroporto a fim de embarcar para Lyon, onde ficaria uma semana. A mocinha do balcão: “Não estamos despachando malas, por que não veio ninguém para manuseá-las”. Perguntei se o vôo estava garantido, mas ela não soube informar :(

Felizmente, deu tudo certo. O maior contratempo foi entrar com uma mala – muito longe de ser de bordo – num avião tipo Embraer.

Novembro e dezembro foram meses de manifestações, reuniões da Comunidade Europeia e da OTAN. Tudo isso significa ter um gostinho do trânsito paulistano - só um gostinho - pois quase todos os órgãos internacionais e locais estão entre a minha casa e o trabalho.

É muito comum cruzar com policiais batedores que bloqueiam totalmente o trânsito para carros oficiais. Diplomatas e burocratas costumam usar os hotéis perto de casa. Alguns figurões precisam das avenidas só para eles, e olha que as avenidas já não são tão largas. A Polícia daqui parece ser especialista nisso. Aparentemente, só nisso.

Quem não fez greve nem corpo mole na última semana foram os bandidos. Não estou falando do padrão de bandidos brasileiros: sequestradores, assassinos e deputados. Falo de gatunos.

Enquanto estava em Lyon, um par deles fez uma limpa lá em casa. A lista de perdas é enorme, mas como a gente sempre diz, são perdas materiais. A sensação de chegar em casa e encontrar tudo revirado e jogado no chão não é nada agradável. Que seja a última vez!

A única contribuição da Polícia local para este breve relato foi a dedução de que eram dois furtadores. O “CSI Bruxelas” encontrou duas pegadas diferentes. Sabe até a marca dos sapatos. Por outro lado, depois de emporcalhar ainda mais o meu apartamento com pós pretos e brancos, não achou nenhuma digital.

A verdade é que esse tipo de crime é muito mais comum do que imaginava. Basta comentar o ocorrido entre colegas, que acabamos descobrindo quão comum são tais furtos. Se a Polícia local não pode ajudar, a maioria das pessoas já tem seus suspeitos: os ciganos. Segundo a sabedoria popular belga, são os únicos que levam os seus melhores jeans.

Ciganos ou não, tem alguém abafando por aí nesta noite de sábado em Bruxelas: Calça nova, camisa nova, casaco novo, tablet novo, celular novo, relógio novo e até perfume novo. Como consolo, só me resta escrever um post novo.


Foto: A Place des Jacobins em Lyon e seu abat-jour gigante na Fête des Lumières 2014. Eu estava lá, enquanto...

Sunday, December 7, 2014

Pomba e circunstância

A Bélgica tenta inscrever a batata frita no Patrimônio Cultural da Unesco. Apesar de serem reconhecidas como “French Fries”, sua origem é provavelmente belga, embora  Espanha e França também disputem a paternidade. 

Pouco importa a história da batata frita. O fato é que, morando-se em Bruxelas, não dá para evitá-las, pois acompanham uma grande diversidade de pratos, dos mais simples aos mais sofisticados.

Jantar de trabalho num elegante restaurante de Bruxelas. Para variar, as fritas estavam em todos os pratos. Assim que comuniquei minha escolha para o maître, um colega fez uma ressalva: “Almôndegas? Você vem num restaurante desses e pede almôndegas!?”

Respondi: “Bom, se fosse tão inapropriado, não estaria no cardápio”. Se a discussão fosse em português, caberia ainda um “ora bolas”! 

Almôndegas podem ser gostosas, mas sofrem de certo preconceito. Algo para se comer em casa. De qualquer modo, fiz o que sempre faço. Peço o  que tenho vontade, aquilo que desperta o apetite. O molho estava tão bom, que não tardou para meu colega emprestá-lo para temperar suas fritas ;-)

Nos quatro anos passados na França, a saudade da comidinha brasileira sempre apertou. A diversidade gastronômica europeia é ótima, mas nem todo dia quero comer uma boa caça. Anos atrás, estive num estrelado restaurante francês, daqueles que o menu é escolhido pelo chef. O prato daquela noite era pombo, algo muito mais sofisticado do que um reles galináceo. Entretanto, naquele dia, eu não queria pombo, pombas!
   
Quando perguntei – com toda delicadeza possível - se havia alternativa, todos olharam para mim. Espanto geral. Aqueles dois segundos até o maître responder pareceram uma eternidade, mas o chef, como de hábito, tem sempre uma alternativa. Havia uma carninha deliciosa. Não me lembro muito bem do corte nem do preparo, mas, com certeza, não foram almôndegas.



Foto: Fechando as fotos de Biarritz, o entardecer na Grande Plage.