Sunday, June 21, 2015

Waterloo


Passou 2014 e não escrevi  aquele prometido post sobre o centenário da Primeira Guerra. Para falar a verdade, não li tudo o que queria sobre o tema e acabei deixando o assunto de lado. Nesses dias, comemorou-se mais uma data histórica, o bicentenário da Batalha de Waterloo, que representa o fim do perído napoleônico. Dessa vez, não deixo passar em branco.

Quando o assunto é Waterloo, a França faz picuínha. Atrapalha a comemoração dos outros e ainda não envia seus representantes oficiais ao cenário da batalha. O governo faz feio, mas a imprensa foi magnânime. Fez intensa cobertura de um fato histórico tão importante para a formação da Europa. Hollande não foi. Mas eu fui!

Fui eu e mais 60 mil! Como os campos de Waterloo são afastados do centro de Bruxelas, tive meu momento paulistano ao dividir a estrada com 20 mil carros. Imagino que as centenas de milhares de homens e cavalos que lá chegaram, duelaram e pereceram há 200 anos causaram menos impacto do que todos esses automóveis.

A  Batalha de Waterloo é muito apropriada para ser reconstituída.  Foi uma das últimas batalhas à moda antiga, com tropas inimigas emparelhadas, aproximando-se até aquele sanguinário “mano a mano”. O outro aspecto peculiar é que esta batalha realmente ocorreu numa área pequena, viabilizando a reconstituição com muito realismo.

O lado menos interessante do excesso de realismo é a fumaça. Estava atrás da artilharia de Wellington. A fumaça excessiva dos canhões atrapalha bastante a visão. Considerando-se a precisão das armas de fogo da época, entendo que os canhões tinham mais um efeito moral do que letal.

Veio gente de todo mundo assistir ao espetáculo. Os ingleses eram maioria entre os estrangeiros. Óbvio. Um casal de ingleses perguntou: “Você veio do Brasil só para assistir ao show?” Não é bem assim J

Se a reconstituição deste ano foi especial, o evento ocorre todos os anos. Fica a dica!



Fotos do espetáculo da reconstituição da batalha de Waterloo. Acima,  detalhe da artilharia inglesa no meio da fumaça. Abaixo, visão geral do "batalhódromo" atrás da linha inglesa. Mais abaixo, Wellington observa o avanço da infantaria francesa.



Thursday, June 18, 2015

Discurso de rei

Junho é mês de eventos na Europa. A razão é muito simples. Maio é mês de feriados e julho é mês de férias.

Além da concentração junina, há também um acúmulo de eventos às terças e quintas. Segunda e sexta são dias evitados pelos organizadores por razões óbvias. Quarta também, por que é feriado escolar (França) e muitos pais adotam um regime de trabalho especial, que permite acompanhar seus filhos.

Nesse contexto, terça-feira, dia 16, fui convidado para cinco eventos sobre a “revolução digital”. Confirmei presença em três e estive em dois. Ando fazendo overbooking de agenda. Na  véspera, decido o que vou encarar. (Já fui mais bonzinho!)

Só não quero mais encarar o discurso do presidente do Uber da França ou da Bélgica. Chega! Também não quero mais palestrantes, que tentam nos convencer de que é preciso mudar para o universo digital. Como disse o Jacques Attali, numa das palestras deste mês, não foi preciso convencer o mundo a adotar a TV há 50 anos. Nem  mesmo o telefone há 100 anos.

A palestra mais inusitada  deste mês repleto de colóquios não foi de nenhum bilionário fundador de start-up, nem de nenhum guru profissional. Foi um depoimento de um executivo que, ao invés de contar vantagem, confessou a sua impotência diante dessa transformação “vertiginosa” (sic).

Trata-se de um dirigente de uma vinícola de Sauternes. Elegante, francês perfeito e fala suave. Um verdadeiro nobre com humildade ímpar. Diante de blogs de vinhos que já são mais influentes do que a Wine Spectator, comerciantes virtuais cada vez mais poderosos, centenas de aplicativos e sites sobre o tema, ele  e os 10 funcionários da vinícola estão simplesmente perdidos.

Quase em tom de despedida, relembrou  os bons momentos vividos com seus clientes e visitantes, que vão pessoalmente ao Château. Ressaltou o privilégio de degustar os vinhos com tantos amigos e clientes, naquele clima especial que surge ao redor de um bom vinho. Bons tempos, hein!

Foi uma oportunidade de pensar revolução digital sob uma outra perspectiva. Isso sim é palestra inspiradora. Nosso executivo certamente não está só.  Ser um produtor de Sauternes não é para qualquer um, mas as transformações mencionadas por ele são implacáveis.

A propósito, o nobre palestrante é nobre mesmo.  Embora tenha apresentado-se como um mero gerente de château, uma rápida consulta ao Google confirmou o que desconfiava. O ilustre membro da Casa de Orleans é cheio de títulos honoríficos e pretendente ao “trono francês”.



Foto: A orangerie do Château de Seneffe, na Bélgica.