Monday, August 1, 2011

Vox populi

Uma recente pesquisa do IBOPE, divulgada no Estadão, mostrou que a maioria dos brasileiros (55%) é contra a união estável entre pessoas do mesmo sexo ("casamento gay"). Mesmo sendo favorável à matéria, a aprovação pelo Supremo chamou minha atenção. Fiquei curioso pelos caminhos que a sociedade encontra para se aperfeiçoar, mesmo contra a suposta vontade da maioria. Certamente, não foi o único episódio da nossa História. Seria um paradoxo da democracia? 

A dificuldade de aprovação do "casamento gay" no Congresso pode ser compreendida. Não foi o poder do lobby católico-evangélico, mas a própria vontade do povo. O poder legislativo representa o povo. Seria justo cobrar este tipo de progresso social do Congresso? Seria incumbência dos outros poderes?

O Ricardo Amorim (@Ricamconsult no Twitter) foi mais provocativo e tuitou:  "Segundo IBOPE, maioria é contra união gay. Ainda vamos nos envergonhar disso. Maioria já foi contra fim da escravidão e voto das mulheres.”

O paralelo sugerido pelo Ricardo é inteligente. Talvez, discorde do motivo da vergonha, pois a sociedade está sempre em transformação. Os eventos históricos suscitam controvérsias, porém, em ambas as situações, o Brasil estava muito dividido.

Todos sabiam que a abolição viria mais cedo ou mais tarde. A resistência era grande por que uma parte do Brasil protegia seus interesses. Até a classe média possuía escravos! A aristocracia rural também dava como certa a abolição, mas brigou até o fim por uma indenização pelos escravos libertados.  A Princesa Isabel formalizou o fim da escravidão com a sua canetada histórica, sem indenização aos proprietários de escravos, que viraram republicanos instantaneamente (Já viram isso?).

O sufrágio feminino também foi resolvido com uma canetada de Getúlio Vargas em 1932. O ativismo feminino cresceu no seu governo e a causa foi misturada com os movimentos sociais, que espalhavam-se pelo país. Possivelmente, muitos brasileiros eram apenas indiferentes ao tema, daí a suposta oposição da maioria. Se houvesse uma pesquisa de opinião nos anos 20-30, as mulheres não seriam entrevistadas! Depois de anos de discussão e indefinição, Getúlio encerrou o assunto e capitalizou.

Em ambos os casos, mesmo que a maioria da população ainda não apoiasse a causa, a Princesa Isabel e Getúlio Vargas estavam diante de uma tendência inequívoca, seja pela realidade no exterior ou pela mobilização crescente da nossa sociedade. Coube a eles mostrar o caminho.

O Brasil mudou. Temos uma Constituição mais moderna e respeitosa aos direitos do cidadão. Não temos mais monarcas nem ditadores. O papel do Supremo, como árbitro em grandes debates nacionais, será cada vez mais comum, numa situação similar aos EUA. Livre de preconceitos e interesses, o Supremo deve decidir segundo o espírito da Constituição. E que venham outros debates, pelo bem do Brasil!


Fotos: Acima, uma esquina charmosa de Arbois, a caminho da casa onde viveu Louis Pasteur,a atração principal da cidade (abaixo).

2 comments:

Felipe Pait said...

A maioria dos brasileiros é contra o Corinthians. Pode torcer para qualquer outro time. Mais uma geração, o povo se acostuma, cada um casa ou não com quem quiser, isso sai da pauta da política. Esse é o cenário otimista.

Ou então vem aí um partido taliban estilo Glenn Beck. Daí nós vamos ficar nos lamentando das décadas perdidas por petistas e tucanos, 2 partidos de centro brigando um com outro, enquanto a extrema direita se aproveitava da merda espalhada para dizer "merda por merda, vamos à ditadura".

Nivaldo Sanches said...

Post muito inteligente e instigante, Fernando - aliás, como de hábito no seu blog ...

Acho que, segundo a tradição sociológica, as classes mais pobres são historicamente mais conservadoras, e a sociedade brasileira reflete isso. Qualquer pesquisa desse tipo dará resultados assombrosos - provavelmente, a maioria é a favor da pena de morte e dos linchamentos, é contra e deseja a prisão de qualquer tipo de usuário de drogas, é absolutamente contra qualquer coisa que cheire a "modernidades" - como o casamento gay, ou o aborto, ou sei lá o quê.
Cabe aos formadores de opinião - geralmente, vindos de classes econômicas mais bem posicionadas - apontar os rumos do futuro. Por isso os filósofos políticos mais clássicos costumam dizer que a ideologia de uma sociedade é necessariamente a ideologia de sua classe dominante.