Friday, September 18, 2015

Recorrência

Durante o verão europeu, renovei alguns documentos belgas. Apesar dos avanços da máquina pública, de vez em quando, as ortodoxias burocráticas podem surpreender.

A prefeitura de Bruxelas solicitou-me um atestado de bom comportamento. E onde é que se tira o tal atestado? Na própria prefeitura. Pelo jeito, o pessoal do segundo andar não fala com o do primeiro.

Na ocasião, a recepcionista  perguntou: “Por que o Sr. precisa disso?” Respondi que era um pedido do pessoal do andar de cima! Como bom paulistano, falei fazendo mímica, apontando para o andar acima com o dedo indicador.

A situação hilária é incompreensível, pois está tudo no mesmo prédio e é bem informatizado. Para se inventar um Poupatempo belga só seria preciso um pouco de boa vontade. Mas isso não foi o pior.

A moça ainda solicitou a apresentação do documento de identidade, cuja renovação era o próprio objetivo do meu périplo. Felizmente, o documento ainda tinha alguns dias de validade. Caso contrário, seria vítima de uma recorrência burocrática, condenado a passar o resto dos meus dias entre o primeiro e o segundo andar.

Recorrência burocrática existe mesmo. Um exemplo não incomum acontece com muitos expatriados, quando os fiscos dos países envolvidos disputam o campeonato mundial de ganância tributária. Bem, isso é uma outra história.

E por falar em extravagâncias regulamentares, retomo a questão do Uber, tema de um post de março, que continua fazendo barulho em todo o mundo.

Há alguns anos, uma comissão liderada pelo Jacques Attali fez um relatório com sugestões para dinamizar a economia francesa. Uma delas era a desregulamentação do setor de táxis. Não existia o Uber, mas uma clara percepção de que nesse setor há pouca oferta, pouca concorrência e um potencial razoável para criação de empregos.

Que cada ortodoxia regulatória encontre o seu Uber! Ainda existirão alguns nichos de resistência como os taxistas e a prefeitura de Bruxelas. Felizmente, eles caminham para ser exceções.


Foto: O imponente prédio da Fundação Louis Vuitton, projeto de Frank Gehri, inaugurado em 2014. Paris não dorme no ponto. Apesar da falta de táxis e dos banheiros sujos, não faltam atrações.

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