Sunday, August 25, 2013

Damasco


A questão síria prolonga-se acumulando dezenas de milhares de vítimas e o mundo não consegue resolvê-la. É impressionante como não temos mecanismos para sair desse tipo de impasse e reagimos muito lentamente diante de tais tragédias anunciadas.

A Síria é um caso desafiador. É um dos palcos da disputa sanguinária entre sunitas e xiitas. O Ocidente quer afastar Assad do poder, mas sabe que o regime que o substituiria seria ainda menos simpático às suas causas. De um lado temos Assad, Irã e Hezbollah. Do outro, Al-Qaeda.

Um estudioso americano propõe que os EUA perpetuem a guerra, ajudando ora um dos lados, ora outro. Quando mais durar o conflito, melhor. Bem, se tudo fosse um jogo, estaria certo. Entretanto, falamos de vidas humanas! Será que não aprendemos nada no século passado?

Felizmente, entre Estados Unidos e Europa, a maior parte luta por uma intervenção no sentido de se deter Assad com urgência. Felizmente, eles não veem xiitas ou sunitas, mas seres humanos.

A China e a Rússia apoiam abertamente o governo Assad, impedindo qualquer intervenção da ONU.  Já o governo brasileiro, numa atitude vergonhosa, faz pouco caso das vítimas e espera por um “entendimento” entre as partes.

Na prática, Brasil, Rússia e China, ajudam a prolongar essa situação. Basta os EUA e a Europa alimentarem clandestinamente a oposição a Assad, que o cenário descrito pelo estudioso americano está configurado.

Só nos resta cumprimentar a diplomacia do Brasil, da Rússia e da China por esse trabalho tão respeitoso aos direitos humanos e tão inteligente. E os sírios? Bem, enquanto eu escrevia esse post, morreram mais alguns.


Foto: Mais uma cena de Bruges.

Saturday, August 17, 2013

Poltergeist

Alguns artigos estrangeiros celebram a queda da criminalidade no primeiro mundo. Bem, só podia ser lá fora, é óbvio! O mais interessante é que até mesmo a profunda crise não modifica a tendência. Segundo especialistas, o fenômeno deve-se a uma série de fatores como a vigilância onipresente, o envelhecimento da população, a eficácia das modernas técnicas de investigação, etc. Enfim, sob tais condições, o crime não compensa.

Já no terceiro mundo, o crime continua compensando. E muito. Em maio, escrevi o post "o crime da semana", sobre os eventos bárbaros que continuam nos chocar frequentemente. Convido você à sua releitura. Como será o próximo crime da semana?

Numa perspectiva histórica, Rio e São Paulo reduziram fortemente seus índices de criminalidade, mas ainda estão num patamar inaceitável. Em termos relativos, São Paulo é a capital menos violenta do Brasil. Nossos irmãos nordestinos, contudo, rivalizam com países em plena guerra civil. Suas taxas de homicídios são piores do que as iraquianas.

Uma das explicações mais comuns é que a bandidagem prosperou no Sudeste e invadiu o Norte e Nordeste, onde encontrou mais pobreza e uma polícia ainda mais despreparada. Atenção, eu disse "ainda mais"! Terreno perfeito para a explosão da violência. Se nós, paulistanos e cariocas, não admiramos nossas polícias, imaginem os outros!

Sonhamos com uma polícia preparada e competente, que investigue e solucione todos os crimes, independentemente das vítimas, seja um colunável ou o Amarildo. Sabemos que hoje é impossível. Desta forma, penso que quando se trata do "crime da semana", quando os holofotes da mídia estão sobre as 'otoridades', eles não deveriam falhar. É a chance de mostrar que a 'corporação' tem um pingo de seriedade.

A título de exemplaridade, para motivar os seus quadros e inspirar a confiança da população, esses crimes deveriam ser resolvidos. Que tragam especialistas de fora e usem os recursos mais modernos que a tecnologia proporciona!

Infelizmente, as polícias do Rio e São Paulo perdem essa oportunidade. Brindam-nos com histórias pouco críveis. Exemplos? No Rio, tivemos o poltergeist do Amarildo, quando vários dispositivos eletrônicos falharam simultaneamente. Em São Paulo, a história policial já nos trouxe personagens fantásticos como o Homem Invisível na Rua Cuba, o Homem Aranha no sequestro do Sílvio Santos e, mais recentemente, o malvado Chuckie, matador de famílias.


Foto: Um convento no centro de Bruges. Tranquilidade pura.

Saturday, August 10, 2013

Cartel

O caso dos trens paulistanos terá uma repercussão desproporcional. Se depender do PT, ele será explorado até as últimas consequências, com o intuito evidente de se abafar os escândalos dos governos petistas.

Ninguém duvida da existência de um cartel. Os grandes atores do mundo ferroviário já receberam punições exemplares fora do país. É assim em todo o mundo! Fica uma questão para os economistas, talvez seja ilusão querer uma real competição no setor.

A grande dúvida é o envolvimento do governo ou de funcionários públicos. Embora o valor das supostas propinas não pareça exorbitante, corrupção é corrupção e deve ser punida.

Se confirmado, o caso ilustrará como a corrupção está profundamente impregnada na máquina pública brasileira, independente de partido. Como neste caso, no Mensalão e em tantos outros, os grandes desvios são feitos em parceria com agentes privados, encobrindo-se mais facilmente os rastros da operação.

Muito provavelmente, essa história estava preparada para eclodir no momento certo. Era um coringa petista. Depois das manifestações e da queda brutal de popularidade da Dilma, o escândalo vem colocar a disputa PT X PSDB num empate técnico moral.

A essa altura do campeonato, não sei como  FHC poderá convencer o povo de que não é farinha do mesmo saco (nas suas próprias palavras). Precisaria de uma senhora retórica, recorrendo à Ética, Economia e Filosofia. Tudo que o povo não quer ouvir. Luta inglória.

Mesmo com algumas dúvidas sobre o caso, para mim, é mais uma evidência de que não mudaremos nada em 2014. Não é uma questão de nomes. O sistema está doente. Se as manifestações não servirem para reformar a política nacional, então não serviram para nada. O cartel dos atuais partidos brasileiros é infinitamente pior do que o cartel dos trens.


Foto: Outra tomada da Praça do Mercado, em Bruges.

Sunday, August 4, 2013

A capa

Há alguns dias, recebi uma nobre encomenda: preparar uma visão de longo prazo. Não exatamente fazer um plano estratégico, mas descrever o mundo em 2020.

Depois de duas horas e meia de reflexão e mais o mesmo tempo de Powerpoint, estava pronto. Modéstia à parte, muito mais bem feito do que os slides divulgados pelo Snowden.

Precisei de duas horas de meia de Powerpoint, pois estava usando um micro novo. Perdi tempo com um teclado diferente. Já com relação ao tempo de "brainstorming", foi o necessário para colocar as ideias que vagavam pela minha mente numa sequência apresentável. Na prática, pensei no assunto muito mais do que duas horas e meia .

Com o intuito de ser bem ilustrativo, entre os inúmeros slides, mostrei algumas manchetes de 2020, como se fossem capas dos principais jornais e revistas da época.

Neste post, não falo sobre as notícias em si, mas pergunto se realmente teremos tais manchetes em 2020? Alguém vai ligar para a capa da versão impressa do New York Times? Ou para o seu site? Vai existir o New York Times? Vai sobrar algum jornal impresso?

No meu Powerpoint, pedi licença para seguir com os exemplos de notícias. Uma licença didática para continuar com tamanho anacronismo. Em 2020, teremos notícias. Não serão capas do Wall Street Journal ou do Estadão, mas chegarão até nós de alguma forma.

Além dos nossos inseparáveis smartphones, esperamos por uma nova geração de produtos conectados: óculos, relógios, roupas, tatuagens, chips sob a pele, etc. Sem contar nossos carros e casas, que estarão igualmente conectados. Receberemos mensagens e informações permanentemente.

No meio dessa abundância de informação, onde poderemos instalar filtros para escolher as notícias preferidas, não existirá mais espaço para a capa da Veja ou a para a primeira página da Folha. A imprensa escrita pode ter seus defeitos, mas a distribuição de notícias numa folha de papel ou num site ajuda-nos a formar a visão do todo ou a estabelecer o peso das coisas. Perderemos tais referências?

Imagino que a maioria dos leitores já esteja se acostumando a navegar pelas notícias no hiperespaço, pulando de um site para o outro. É só uma questão de hábito. Quem sempre procurou informação, saberá onde encontrá-la, assim como ainda existirão milhões de alienados, mesmo que - literalmente - envolvidos  pela informação.

Novos conceitos deverão surgir para substituir as referências da mídia impressa. Imagino coisas como os já conhecidos "mais lidos", "mais comentados", "mais curtidos", "mais retuitados", etc.

Em 2020, estaremos um pouco mais velhos. Sentiremos saudades ao passar pelas bancas de jornais e perceber que lá já não há mais nenhum jornal ou revista à venda.

   
Foto: A Praça do Mercado e o Campanário Belfort (1240), em Bruges.