O recente episódio da vacinação clandestina de políticos e
empresários mineiros é muito emblemático. A malandragem brasileira talvez tenha
ido longe demais.
Em quase todo o mundo, a guerra contra a Covid-19 exigiu que
os Estados assumissem a distribuição das vacinas, definindo critérios para
estabelecer a ordem em que seus cidadãos recebem as suas doses. Isso vale até mesmo
para países sem tradição de grandes campanhas de vacinação universal. Pois é, o Brasil, uma referência no assunto, virou motivo de chacota.
A discussão sobre a abertura de frentes de vacinação
paralelas não vingou em quase nenhum país. No Brasil, a expectativa pelo fura
fila é enorme. Entretanto, pior do que discuti-lo é partir para o ato, como no
caso da ação clandestina de Belo Horizonte.
A essa altura, todo mundo sabe do ocorrido. Os malandros que
passaram a perna no esforço nacional de vacinação foram enganados por uma outra
trapaceira, que não era enfermeira e nem aplicava vacinas. Os malandros se dão
bem até encontrarem malandros melhores.
Todos os leitores têm suas histórias para contar sobre a
nossa malandragem patológica, que possui ligações umbilicais com a corrupção na
política e a criminalidade comum. Apenas para exemplificar, há poucos meses,
num mesmo final de semana, senti essa delinquência nacional de perto:
1) Normalmente, uso aplicativos para comprar refeições (delivery). Nesse dia, decidi contatar o restaurante, que enviou seu motoqueiro
com a maquininha. Fui ao seu encontro para pegar a encomenda e pagar com o
cartão. Encurtando a história: o motoboy usou a sua própria maquininha, passou
meu cartão e fugiu. Enganou a mim e ao restaurante de uma vez só.
2) No mesmo dia, minha esposa mostrou uma daquelas falsas campanhas concebidas para o sequestro da conta Whatsapp. Apesar da bela peça publicitária, ela estava atenta. Quando recebeu a mensagem com o tão desejado código
do Whatsapp, a ficha caiu.
3) No dia seguinte, abasteci o carro no posto de sempre.
Quando o tanque já estava pela metade, estranhei os frentistas. O posto guardou
as cores verde e amarela, embora não fosse mais da Petrobrás. Mudaram a
bandeira e ficaram na moita atraindo os incautos.
E assim vai. São inúmeros eventos sucessivos. Para evitar ser
surrupiado ou sofrer algum golpe, melhor não se distrair por um segundo. O Brasil
não é para amadores. Essa associação de corrupção, criminalidade e malandragem
faz com que muitos dos nossos amigos lá fora desistam de voltar.
Enfim, gostaria de conhecer as respostas para este mistério brasileiro. Talvez aqueles que acreditam na roubalheira generalizada, até por fazer parte dela, sentem-se no direito de explorar o próximo. Afinal, ladrão que rouba ladrão... É a trágica sina de uma pátria malandra.
Foto: Uma outra tomada da Plaza Mayor, em Madrid. O inverno
de 2020 foi bem camarada.
1 comment:
Detesto zap, abasteço meu veículo com banana. E evito delivery - os negócios estão indo bem, dá para pagar eu mesmo para fazer a janta ;-))
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