Tuesday, July 16, 2024

Revogando a Lei de Moore


Este artigo foi publicado originalmente em fevereiro de 2001 pela Computerworld Brasil. Como ele não está mais disponível online, resolvi republicá-lo aqui. Não tem nenhum valor científico ou jornalístico, mas retrata bem o 'espírito daquela época', em que eu era um gestor de tecnologia assustado com a evolução das coisas.


Revogando a lei de Moore


Comecemos este artigo por um teste de múltipla escolha. A famosa Lei de Moore diz que a capacidade dos microprocessadores dobra:

a) A cada ano;
b) A cada ano e meio;
c) A cada 2 anos;
d) Todas as anteriores;
e) Nenhuma das anteriores.

O impacto da Lei de Moore é um dos fatos marcantes do nosso mundo. Grande parte dos benefícios que a tecnologia proporcionou, inclusive a Internet, está associado a este fenômeno.

Em 1965, as coisas não eram tão evidentes. A profecia de Gordon Moore foi realizada com base nas primeiras gerações de microchips, que haviam recém alcançado a marca de 64 transistores por chip. Hoje, a linha Pentium chega a dezenas de milhões!

O marco é a antevisão de um sustentável crescimento exponencial. Se dobrarmos a capacidade a cada um ou dois anos, não faz tanta diferença. O privilegiado Gordon, um dos fundadores da Intel, sempre receberá o crédito. A propósito, a resposta do teste é "d". O enunciado original era de um ano. Tempos depois, passou para dois. Hoje é entendida como um ano e meio. Sorte do Gordon, pois com muito mais precisão, muitos cientistas já foram execrados.

Anunciar o fim desta evolução tem sido uma constante. Vários limites tecnológicos, ora intransponíveis, foram superados. A miniaturização se aproxima do limite físico de lidar-se com alguns poucos átomos. Para completar, os custos de produção também crescem exponencialmente.

As previsões de uma forte desaceleração deste processo são reservadas para a próxima década. Até lá, outras tecnologias já poderão estar no forno para retomar o passo: computadores quânticos, óticos, moleculares, genéticos, etc. Por enquanto, é apenas teoria.

O que aconteceria se chegássemos a uma estagnação desta progressão? Não pensem vocês que seria o caos e o fim da revolução digital. Pelo contrário, há quem diga que seria muito saudável!

Analise o seu microcomputador. Provavelmente, a CPU é de última geração. Agora, pense nos demais componentes, veja que muitas tecnologias não se aperfeiçoaram tanto. O pior de tudo, motivo dos nossos pesadelos, é o software. Não há dúvidas de que poderia ser bem melhor!

Enfim, parece que as deficiências do conjunto são compensadas por uma capacidade colossal de processamento. Se mantivéssemos as mesmas CPUs e investíssemos no resto, poderíamos manter a melhoria do todo.

Os mercados mais desenvolvidos estão desacelerando o ritmo de renovação dos PCs. Afinal, para a grande maioria das aplicações, não importa ter um chip de 500 ou 900 MHz. A Intel mantém seu crescimento e força, pois, fora dos Estados Unidos, ainda há muito computador para se vender. Sem contar as aquecidíssimas vendas destinadas ao mercado de servidores.

Os microprocessadores logo proporcionarão novidades ainda mais fantásticas, como a comunicação plena na linguagem natural. O fim da era do chip de silício pode demorar um pouco. Mas todos nós gostaríamos que toda esta evolução não dependesse apenas da CPU.

 

Imagem: Gerada pelo Copilot Designer (2024). Na primeira tentativa, ele gerou uma imagem abstrata sobre batatas fritas. Chip errado, meu caro!

Thursday, May 16, 2024

Aurora surreal

 

Foi sem querer, eu juro! Acabei ouvindo a conversa da rodinha de senhoras de meia-idade que falavam aleatoriamente sobre muitos assuntos. Pessoas de boas famílias, como se dizia antigamente, o que nem sempre significa boa educação.

Não queria saber da vida delas, mas ouvi algo que me assustou. Dizia uma delas: “Vocês viram essas auroras, que coisa, né? As mudanças climáticas vão trazer muito mais surpresas, aguardem!

Na hora, deu aquela vontade de entrar na conversa e dizer que ela deve ter faltado em muitas aulas na sua juventude. Ela sabe das tempestades solares e sabe das mudanças climáticas. Entretanto, associar as duas coisas é uma barbaridade do naipe do terraplanismo.

Não dá para esperar que todos saibam o que é uma tempestade solar em detalhes, mas o bom senso deveria funcionar. O conhecimento básico do ensino fundamental é suficiente para saber que qualquer coisa que a gente faça aqui neste planetinha não vai afetar aquela gigante esfera de fogo 1,3 milhão de vezes maior do que a Terra.

Parece bobagem, mas educação falha é o terreno fértil para os ‘influenciadores’ espalharem, por ignorância, maldade, ou ambos, as ideias mais idiotas ou maldosas do mundo. Funciona no caso acima, mas também no mundo político, social, econômico, etc.

A pessoa em questão falou besteira sobre mudança climática. Será que ela é melhor quando o assunto é Rússia x Ucrânia, Israel x Hamas, Trump x Biden, etc.? Nem quero saber.

Só a educação liberta. Vagabundos do mundo, vão estudar, por favor!


Foto: Matt Houghton via Unsplash 

Thursday, April 11, 2024

Microconto

Fui o vencedor do tradicional concurso de microcontos da Wired em março de 2024. Um microconto é uma história contada em até seis palavras. Neste post, compartilho alguns comentários sobre essa incrível conquista.

Tentei o concurso de microcontos da Wired várias vezes, ciente da dificuldade de ganhar. Não basta apenas escolher seis palavras genialmente; é necessário estar em sintonia cultural e de expectativas com os jurados. No último mês de março, diante do tema smart house, enviei quatro sugestões. Após o envio, depois de um surto criativo, fiquei muito satisfeito, mesmo consciente da remota possibilidade de ser escolhido. De fato, o microconto vencedor não era o meu favorito.

O tema proposto pela Wired remeteu-me imediatamente a um conto de Robert A. Heinlein, lido há décadas, mas que permaneceu vivo em minha memória. A Casa Quadrimensional é o título do conto, que mais tarde foi incluído em uma coletânea organizada por Isaac Asimov. Sem revelar demais, o conto descreve uma aventura inusitada em uma casa que possui uma quarta dimensão espacial. Assim, a minha primeira sugestão foi: How to disable the fourth-dimensional feature?

Refletindo, percebi que isso fazia muito sentido para mim, mas se os jurados não estivessem familiarizados com a obra de Heinlein, não teria o mesmo impacto para eles. Portanto, inspirado pelas dobras espaciais do conto, criei uma versão mais atual, engraçada e nerd, que acabou sendo a grande vencedora: Our apologies! House-auto-fold is in beta.

Um dos privilégios do vencedor é ter sua obra ilustrada pela equipe da Wired (imagem deste post). O ilustrador dedicou-se bastante e capturou bem o espírito do que estava escrito. No entanto, senti que a ilustração ficou um pouco infantil em comparação com a sofisticação do conceito inicial.

Minha última sugestão, que me deixou muito satisfeito, foi: How to stop it from mining bitcoin? Achei-a pertinente e divertida, e era nela que eu apostava.

Enfim, este é o pequeno 'making of' de um microconto campeão.


 

Wednesday, April 7, 2021

A trágica sina de uma pátria malandra


 

O recente episódio da vacinação clandestina de políticos e empresários mineiros é muito emblemático. A malandragem brasileira talvez tenha ido longe demais.

Em quase todo o mundo, a guerra contra a Covid-19 exigiu que os Estados assumissem a distribuição das vacinas, definindo critérios para estabelecer a ordem em que seus cidadãos recebem as suas doses. Isso vale até mesmo para países sem tradição de grandes campanhas de vacinação universal. Pois é, o Brasil, uma referência no assunto, virou motivo de chacota.

A discussão sobre a abertura de frentes de vacinação paralelas não vingou em quase nenhum país. No Brasil, a expectativa pelo fura fila é enorme. Entretanto, pior do que discuti-lo é partir para o ato, como no caso da ação clandestina de Belo Horizonte.

A essa altura, todo mundo sabe do ocorrido. Os malandros que passaram a perna no esforço nacional de vacinação foram enganados por uma outra trapaceira, que não era enfermeira e nem aplicava vacinas. Os malandros se dão bem até encontrarem malandros melhores.

Todos os leitores têm suas histórias para contar sobre a nossa malandragem patológica, que possui ligações umbilicais com a corrupção na política e a criminalidade comum. Apenas para exemplificar, há poucos meses, num mesmo final de semana, senti essa delinquência nacional de perto:

1) Normalmente, uso aplicativos para comprar refeições (delivery). Nesse dia, decidi contatar o restaurante, que enviou seu motoqueiro com a maquininha. Fui ao seu encontro para pegar a encomenda e pagar com o cartão. Encurtando a história: o motoboy usou a sua própria maquininha, passou meu cartão e fugiu. Enganou a mim e ao restaurante de uma vez só.

2) No mesmo dia, minha esposa mostrou uma daquelas falsas campanhas concebidas para o sequestro da conta Whatsapp. Apesar da bela peça publicitária, ela estava atenta. Quando recebeu a mensagem com o tão desejado código do Whatsapp, a ficha caiu.

3) No dia seguinte, abasteci o carro no posto de sempre. Quando o tanque já estava pela metade, estranhei os frentistas. O posto guardou as cores verde e amarela, embora não fosse mais da Petrobrás. Mudaram a bandeira e ficaram na moita atraindo os incautos.

E assim vai. São inúmeros eventos sucessivos. Para evitar ser surrupiado ou sofrer algum golpe, melhor não se distrair por um segundo. O Brasil não é para amadores. Essa associação de corrupção, criminalidade e malandragem faz com que muitos dos nossos amigos lá fora desistam de voltar.

Enfim, gostaria de conhecer as respostas para este mistério brasileiro. Talvez aqueles que acreditam na roubalheira generalizada, até por fazer parte dela, sentem-se no direito de explorar o próximo. Afinal, ladrão que rouba ladrão... É a trágica sina de uma pátria malandra.

 

Foto: Uma outra tomada da Plaza Mayor, em Madrid. O inverno de 2020 foi bem camarada.

Sunday, March 14, 2021

Para salvar o Brasil dos políticos do amanhã


 

Nos meus poucos textos sobre política, a intenção é de construir alguma coisa, mostrar uma perspectiva alternativa ou fazer uma interpretação dos fatos. Nunca uso esta ferramenta para desabafar ou transmitir qualquer mensagem contrária aos interesses nacionais. Aliás, se quiser desabafar, uso o Twitter.

Esta semana foi bastante movimentada na política nacional. Na fase mais terrível da pandemia, o STF centralizou as atenções com a anulação das condenações do Lula e o julgamento sobre o juiz Sérgio Moro.

A Lava Jato já estava nocauteada. O destino do juiz é apenas a cereja do bolo para muitos, entre os quais, o Lula. Existem várias possibilidades em relação ao futuro das duas personalidades, o que não muda a minha conclusão. A questão não deve ser quem foi punido ou deixou de ser punido pela famigerada operação, mas se teremos uma política bandida para sempre.

Deixando as nossas eventuais preferências de lado, parto das seguintes premissas: 1) A corrupção em todas as instâncias de governo do Brasil é generalizada; 2) A impunidade impera; 3) A Lava Jato, que parecia poder mudar este quadro desalentador, sempre esteve longe de ser um consenso entre juristas, principalmente pelos deslizes apontados pelo STF, que, mais cedo ou mais tarde, anulariam todas as condenações.

Quando a gente critica um ministro do STF por ser “garantista”, não é ele que está errado, são as leis e a constituição! Temos que modernizar nosso aparato legal para adaptá-lo à criminalidade do colarinho branco do século XXI. Tudo evolui, em especial o mundo das finanças e tecnologia, propiciando inúmeras situações imprevistas pelas leis antigas, válvulas de escape para o dinheiro sujo e outras circunstâncias amorais.

Não vou julgar ninguém nesse post, pois todos os corruptos estão por aí, livres, leves e soltos. A nossa geração produziu a Lava Jato, que bateu na trave, mas não fez gol. Precisamos pensar em proteger o Brasil das próximas gerações.

Nas últimas eleições, promovemos uma boa renovação do Congresso. Ainda insuficiente. Apesar dos poucos gatos pingados defendendo a pauta anticorrupção, ainda há um grande grupo de rabo preso. Só uma renovação brutal dos parlamentares salva o Brasil. Ela vai acontecer de qualquer jeito e é imprescindível acelerá-la.

A campanha 2022 já começou. A disputa presidencial costuma fazer barulho e capturar toda a atenção. Porém, no nosso presidencialismo moreno, o Congresso tem muito peso. A despeito dos seus muitos representantes indignos para a função, tem sido um freio para as loucuras presidenciais. É desnecessário relembrar os governos Dilma, Temer e Bolsonaro, todos distantes da unanimidade nacional.

Enfim, devemos deixar nossos bandidos de estimação de lado e desejar que as próximas gerações se libertem da discussão de quem rouba mais. Os bandidos de hoje não pagarão pelos seus crimes e o caminho para a correção passa pelo Congresso. Voltarei a este assunto em 2022. Só adiantei a reflexão, pois o clima pré-campanha ficou repentinamente aquecido. O debate e o desafio são bons para o Brasil, mas a disputa presidencial não é tudo.


Leitura complementar:

2022 é agora - Post de junho de 2020 


Foto: Plaza Mayor (Madrid, Espanha). Felizmente, consegui fazer esta viagem de férias no começo de 2020. Voltei poucos dias antes do confinamento.

Thursday, March 4, 2021

Triste fim de um estimado grupo de Whatsapp

 



Tem sido interessante observar a evolução dos diversos grupos de Whatsapp ao longo dos últimos meses. Desde as últimas eleições talvez. A famigerada polarização destruiu qualquer espírito de camaradagem e, muitas vezes, a própria harmonia familiar.

Tiveram mais sorte os grupos temáticos (e.g. futebol, vinho ou filmes) e aqueles estritamente profissionais. Mesmo nesses últimos, de vez em quando, escapa uma provocaçãozinha, merecedora de reprimenda instantânea.

Discutir política é absolutamente necessário, ao contrário do que preconiza a sabedoria popular brasileira. Faz parte do processo democrático e é essencial para a elaboração da nossa visão de país, para a conciliação em torno das grandes prioridades e para a avaliação dos nossos representantes e instituições.

Reconheço que a armadilha da polarização tem impedido as boas conversas. Com os ânimos tão acirrados, insistir no diálogo é desgastante. Exercendo a cidadania, proporcionamos a cizânia.

Tentei classificar o comportamento dos grupos de Whatsapp remanescentes conforme a sua estratégia de sobrevivência:

 

“O silêncio dos inocentes”: Continuam com um monte de gente, que quase não se manifesta. Foram dominados por aquela minoria barulhenta, defensora de uma bandeira política.

“As patricinhas de Beverly Hills”: Tem boa participação, mas faz um grande esforço para ficar nas amenidades e preservar as amizades. Quando surge uma discussão mais contundente, o pessoal esfria e volta à normalidade.

“Feios, sujos e malvados: É o grupo de confronto, se é que sobrou algum deles. É ataque vindo de todos os lados. Mesmo sendo quase tudo fake news, o objetivo é manter o outro sob pressão constante. Vale tudo.

“Turma da Mônica”: Para fugir dos grupos acima, criaram-se inúmeros grupos menores, onde os verdadeiros amigos podem interagir num clima de respeito mútuo.

“O grande ditador: Espero que o leitor não participe de algum grupo desses. Na prática, não é um grupo, mas um órgão de divulgação. É de onde pessoas próximas da política disparam as informações privilegiadas, ou seja, fake news fresquinhas.

 

Se o leitor conhecer algum outro tipo de grupo, compartilhe!

 

Leitura complementar:

Foi por dinheiro - Um post de agosto de 2020

Polarização - Um post de setembro de 2020

 

Foto: Para fechar esta sequência latino-americana, uma foto do Jardim Japonês de Buenos Aires (2020).


Saturday, February 27, 2021

Clubhouse, um mês depois


 

Aconteceu o que eu esperava. Vários grupos passaram do Whatsapp para o Telegram e acabei esquecendo deles. Menos distrações por um lado, alguma perda de informação por outro. No geral, foi positivo como eu esperava.

Distração mesmo foi o Clubhouse. Os primeiros dias de fevereiro foram uma perdição, porque todas as ‘celebridades’ do mundo da tecnologia e inovação estavam por lá e aí rola o chamado FOMO (fearing of missing out). Eu tive que pegar um iPhone velho da minha esposa, pois a versão Android do Clubhouse ainda não está pronta. Sim, eu sou um usuário de Windows e Google!

Em tempos de pandemia soa desnecessário explicar o que é crescimento exponencial e o começo de fevereiro foi um belo exemplo. Os autoproclamados experts no Clubhouse, tinham entrado uma semana antes de você. Quase todo mundo tinha aquele ícone de novato que o app deixa por uma semana junto à sua foto.

Na primeira semana, entrei em um monte de salas para ouvir especialistas, celebridades e anônimos. De fato, fiz alguns contatos interessantes e aprendi algumas coisas. Foi viciante enquanto durou.

Um mês depois, deixei de seguir todos os famosos. Entro apenas quando sou convidado como speaker. Por exemplo, todas as quintas-feiras, às 8 horas, com Cezar Taurion, Marcelo Madureira e João Gubolin.

Por falar em ser speaker, as duas primeiras vezes em que fui chamado para falar foram de surpresa. Na primeira, estava no trono. Na segunda, esbaforido numa esteira. Depois dessas, nada de improvisos.

 

Foto: Ainda no Uruguai, a famosa Casapueblo em Punta del Este.

 

PS: No momento da publicação deste post, tenho 6 convites para o Clubhouse. Se você precisar, mande seu número de celular (iPhone) de forma reservada.