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Thursday, December 10, 2015

Terror de política - Parte 1

2015 entra para a história. Paris viveu os atentados de janeiro e novembro. Dois outros foram evitados, o do Thalys (trem) e o da Igreja de Villejuif. Este blog já especulou sobre as causas sociais e econômicas do terror, mas nunca falou da tecnologia a ele associada.

Sempre encontramos aqueles políticos oportunistas, que se aproveitam do momento para tentar acabar de vez com o que nos resta de liberdade e privacidade. Para tratar de assunto tão importante, farei um texto em duas partes. Começamos recapitulando alguns fatos.

Os terroristas são sofisticados. Os vídeos do Estado Islâmico no Youtube orientam o uso de criptografia em qualquer comunicação. Criptografia de 4096 bits. Para os leitores leigos, saibam que é muuuuuuito seguro.

Nem todo terrorista nasceu para informática. Alguns poderiam trabalhar perfeitamente numa equipe de suporte técnico. Outros estão mais para a equipe da Dilma. Entre erros e acertos, não dá para não falar de tecnologia.

Nos atentados ao mercado Kasher, o terrorista filmou seus assassinatos com uma câmera GoPro. Ele não conseguiu colocá-lo no Youtube por problema de sinal (até tu Paris!). Mesmo com a Polícia às portas, ele sacou o cartão de memória da câmera e carregou num computador. Haja sangue frio.

Um dos meios de comunicação usados nesse ataque contrariou as regras do terrorismo internacional, embora seja criativo. A técnica consiste em compartilhar contas de Gmail. Ao invés de enviar a mensagem, eles deixam-na como rascunho. Como a pasta de rascunhos é sincronizada, eles comunicam-se sem trocar mensagens, que são mais facilmente rastreáveis.

No fracassado atentado à Igreja de Saint-Cyr-Sainte-Julitte de Villejuif, um dos terroristas usava a ferramenta de criptografia “PGP” direitinho. Cometeu um único erro - e fatal - ao apagar uma mensagem sem passar pela criptografia. O cesto de lixo é o pote de ouro dos peritos. A partir desta falha, a Polícia francesa fez a festa e desbaratou todo o bando.

Nos atentados de novembro, o uso de aplicativos como Telegram e Signal pegou a Polícia de calças curtas. São ferramentas de chat com criptografia. Uma outra parte da quadrilha teria usado a função de comunicação do Playstation, algo igualmente difícil de ser rastreado. Se cometeram algum erro, foi ter se livrado de um celular. Aquele celular encontrado no cesto de lixo foi a chave para a rápida resposta da inteligência francesa.

Diante de tudo isso, a reação de alguns políticos desesperados para encontrar bodes expiatórios é esquecer dos  verdadeiros problemas e eleger um culpado: A tecnologia!

Sim, para eles, os culpados são a Internet, os aplicativos de mensagens, a telefonia celular e até o Playstation. Um político pediu o fim dos aplicativos com criptografia. Um outro quer “porta dos fundos” em todos os aplicativos.

Em tempos de desespero, pode ser uma tentação trocar liberdade por segurança. Entretanto, é certamente uma armadilha. Isso fica para o próximo post.


Leia também:
Atentados de janeiro: #jesuischarlie
Atentados de novembro: Terror
Porta dos fundos


Foto: Cenas de Mons (Bélgica), cidade escolhida como capital europeia da cultura em 2015.

Sunday, November 22, 2015

Estado de Sítio

Bruxelas viveu um final de semana sob estado de sítio, com a polícia e o exército espalhados pela cidade. Aqui no meu bairro, tenho cruzado com inúmeros homens fortemente armados desde sexta-feira.

Tinha ingressos para um show ontem à noite, mas o espetáculo foi cancelado. Por ironia, estava em Paris no final de semana passado, onde também não pude fazer o meu programa cultural.

Mesmo sem saber da anulação do show de ontem, confesso que estava preocupado. Vou ou não vou? A ameaça terrorista está sendo levada tão a sério entre a França e a Bélgica, que a tradicional Fête des Lumières de Lyon foi cancelada.

Após uma semana de debates intensos, fiquei muito satisfeito ao perceber que o meu último post, escrito ainda sob o impacto da tragédia, foi bem razoável na análise, apesar da sua brevidade.

No quadro externo, há um amplo entendimento de que é preciso atacar militarmente o Exército Islâmico, cortar suas fontes de financiamento e inibir seu poder de recrutamento, entre outras ações.

No quadro interno, as discussões são mais intensas. Há obviedades como reforçar a vigilância e a inteligência, porém, a unanimidade para por aí. Apesar dos últimos atentados, muitos ainda preferem um pleno respeito às liberdades individuais e à igualdade. Nada de sair prendendo uns barbudos perigosos por aí.

Não tinha percebido duas coisas no momento dos ataques. A primeira é o grau de perversidade dos terroristas. Esses monstros costumam circular entre a Europa e o Oriente Médio quando e como querem. Entretanto, fizeram questão de deixar um rastro associado à entrada de refugiados. Por que dar um presentinho desses aos “irmãos” sírios, que viram as portas fecharem-se em vários países nos últimos dias? Os terroristas sabem que a questão dos refugiados é um debate que divide a Europa. Pegaram na ferida.

A outra coisa que deixei escapar foi o papel da Bélgica. Quer dizer, eu, o povo e o governo belga. Se o Oriente Médio é a universidade do terrorismo, a Bélgica é a sua pós-graduação. A Bélgica dormiu no ponto e permitiu a criação de guetos favoráveis à radicalização. Os rastros dos últimos atentados graves ocorridos na França passam por Bruxelas.

Num final de semana em que pude ler todos os jornais, encontrei sábias palavras de uma executiva belga e muçulmana no L’Echo de sábado: “A Bélgica paga hoje o preço de uma pesada herança deixada por aqueles que preferiram a política do avestruz e do clientelismo com fins puramente eleitorais”.

Já escrevi sobre isso nos posts que sucederam outros atentados. É o mesmo comunitarismo denunciado na França. Políticos abrem mão da laicidade para fazerem concessões à comunidade islâmica a fim de obter seus votos. 

Quanto mais enraizado estiver o islamismo radical, mais difícil combatê-lo.  Não vai ser fácil recuperar toda essa juventude! Só resta esperar por uma semana de paz por aqui. Por aqui, pois na Síria vai cair muita bomba!



Foto: Acima e abaixo, fotos tiradas no último domingo na Praça da República de Paris, lugar que concentra as homenagens às vítimas desses atentados.


Saturday, September 5, 2015

Cuspindo pra cima

Acabaram-se as férias. A volta à labuta tem sido árdua, especialmente para os líderes europeus. O velho assunto dos refugiados virou uma crise internacional.

Puderam ignorar os milhares de mortos na tentativa de cruzar o Mediterrâneo, a superlotação da infraestrutura de acolha e os inúmeros acampamentos clandestinos espalhados pelo continente. Porém, a recente desintegração da Síria e do Iraque entornou o caldo.

As imagens dos mortos nas praias turcas e da multidão atravessando a Hungria a pé são chocantes. Não podemos ignorá-los. O assunto é polêmico, mas a causa humanitária precede o blá-blá-blá político.

Se existe uma expressão, que representa bem o que os líderes mundiais fizeram diante da crise síria ou da ascensão do Estado Islâmico é cuspir para cima. Esqueceram que o Oriente Médio é logo ali. Dá para caminhar da Síria até a Alemanha!

Enquanto os líderes fizerem cálculos políticos, a situação vai perdurar. Qualquer ação terá, num primeiro momento, um preço a pagar, ou seja, um custo eleitoral. Cada um deles deveria perguntar-se sobre a sua real motivação: buscar uma reeleição ou fazer a coisa certa.

Pelo que tenho visto, diante de tamanha crise humanitária, até mesmo alguns dos mais avessos aos refugiados estão comovidos. Há milhares de voluntários mobilizando-se para facilitar a vida dos migrantes, na sua longa caminhada do Levante ao Ocidente. Quero crer que o povo saberá reconhecer os líderes realmente dispostos a trabalhar para resolver o problema.


Post sobre a crise síria (2013)
Damasco
Damasco azedo

Post sobre os refugiados (2015)


Foto: Em Paris, no Jardim de Luxemburgo, no final do generoso inverno de 2015.